Os perigos do autodiagnóstico de doenças mentais pelas redes sociais

Usuários estão utilizando a internet para diagnosticar desordens mentais

Foto: Freepik

Nos últimos anos, cresceu, nas redes sociais, o número de publicações com dicas “milagrosas” para tratar a saúde mental. Embora esses conteúdos ajudem a disseminar informações, também têm impulsionado a quantidade de autodiagnósticos e, com isso, reforçado o estigma em torno do sofrimento psíquico — especialmente entre jovens e adultos de 18 a 44 anos. De acordo com o Instituto Cactus, 45% da população relatou sentir que as plataformas sociais impactam negativamente seu bem-estar psicológico.

Boa parte das publicações sobre saúde mental é pensada para gerar engajamento e despertar identificação nos usuários. No entanto, esse tipo de conteúdo, muitas vezes produzido por pessoas sem formação na área, tende a banalizar os transtornos mentais e seus diagnósticos. Segundo pesquisa do Instituto Ipsos, 45% dos brasileiros afirmam sofrer de ansiedade, sendo a maior incidência em mulheres (55%) e jovens de 18-24 anos (65%).

De acordo com um estudo recente, realizado pelas agências We Are Social e Meltwater, o Brasil ocupa o quarto lugar no ranking de países que mais utilizam redes sociais. Em média, os brasileiros passam cerca de 9 horas e 13 minutos conectados por dia. Esse dado ajuda a explicar o motivo do país estar entre os líderes mundiais em níveis de estresse, segundo o relatório global World Mental Health Day 2024, divulgado pela Ipsos.

Diante desse cenário, especialistas em saúde mental alertam para os riscos do autodiagnóstico por meio das redes. Para Allan Ricarte, psicólogo e docente do curso de Psicologia da UNINASSAU Juazeiro do Norte, ao se deparar com conteúdo sobre doenças mentais, é fundamental compreender que se trata de informações generalistas, muitas vezes elaboradas para chamar atenção, gerar curtidas e causar burburinho.
“A ansiedade, por exemplo, se manifesta em todos, mas nem sempre de um modo disfuncional. Processos como tristeza e irritabilidade em alguns momentos estão, muitas vezes, relacionados a situações cotidianas que costumam nos tirar do lugar de bem-estar completo. Aliás, isso é bastante ilusório”, declara.

Segundo o psicólogo, o principal risco do autodiagnóstico é o indivíduo passar a enxergar sua própria experiência de vida pela lente do adoecimento. “Os três riscos principais seriam: o prejuízo ao autoconhecimento, impedindo a pessoa refletir sobre o que é realmente um sofrimento cotidiano; a relação indevida com a medicação, ou seja, a automedicação; e a perda da confiança na capacidade técnica dos profissionais de saúde mental”, afirma.

Diferentemente do que se popularizou nas redes sociais, a análise de transtornos mentais em adultos é um processo complexo. Ele exige uma série de testes, avaliações, análise comportamental e entrevistas realizadas por uma equipe multiprofissional — podendo incluir psicólogos, psiquiatras e neuropsicólogos. Somente com um diagnóstico preciso é possível definir a melhor abordagem de tratamento e, se necessário, indicar o uso correto de medicamentos.

O autodiagnóstico tende a prejudicar o processo psicoterapêutico. Além disso, grande parte do conteúdo disseminado não é baseada em estudos científicos e desconsidera fatores ambientais, sociais e emocionais que variam de pessoa para pessoa. As redes podem, sim, ser aliadas na disseminação de conhecimento, mas também representam um risco real de desinformação.
“Nas redes, precisamos promover um debate sobre a importância da psicologia, da psiquiatria, da identificação de sintomas e do entendimento de que, às vezes, os sintomas não significam doença, mas representam processos disfuncionais nas relações sociais etc. As plataformas sociais não são um lugar de diagnóstico, consulta ou promoção de práticas de intervenção especializadas”, declara Allan.

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Dalila da Silva

Jornalista graduada pela UFCA/CE, Produtora Audiovisual, Redatora e Revisora Textual.

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