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Campanha de fim de ano com a atriz ultrapassa 30 milhões de menções em 48 horas, provoca reações da direita, pedidos de boicote e, apesar das críticas, impulsiona o engajamento digital da marca
O comercial da Havaianas estrelado pela atriz Fernanda Torres gerou polêmica nas redes sociais a partir de uma fala presente na campanha, na qual a artista defende começar o ano com “os dois pés”. No vídeo, ela afirma: “Desculpa, mas eu não quero que você comece 2026 com o pé direito. Não, não é nada contra a sorte, mas vamos combinar: sorte não depende de você, né? Depende de sorte. O que eu desejo é que você comece o ano novo com os dois pés”.
O comercial da Fernanda foi postado em collab com a marca havaianas nas redes sociais, uma campanha de fim de ano que tornou-se um dos assuntos mais comentados na internet, com mais de 30 milhões de menções em 48 horas em plataformas como Instagram, X, TikTok e YouTube.
A polêmica se deu quando apoiadores da direita política se utilizaram da fala da atriz para problematizar “não começar 2026 com o pé direito”, como uma crítica indireta ao espectro político conservador. Isso levou a pedidos de boicote à Havaianas e ações simbólicas, como vídeos de consumidores cortando ou destruindo chinelos da marca.
Figuras públicas, incluindo políticos alinhados à direita, criticaram a marca e incentivaram a troca por concorrentes. A rival Ipanema, por exemplo, teve um aumento de engajamento e tirou sarro da polêmica nas redes.
O deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) publicou um vídeo no qual joga um par de chinelos da marca no lixo, afirmando que a Havaianas deixou de representar um símbolo nacional ao, segundo ele, adotar uma postura ideológica. Na publicação dos stories, o parlamentar demonstrou frustração com a campanha e incentivou seguidores a repensarem o consumo da marca ao escrever: “Eu vou começar o ano com o pé direito sim – e não será de havaianas”.
O deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG) também se manifestou nas redes sociais com tom irônico, adaptando o slogan da empresa para sugerir que parte do público deixaria de usar os produtos ao comentar: “A partir de hoje, nem todo mundo usará”. A postagem foi interpretada como um chamado indireto ao boicote, reforçando a insatisfação de apoiadores conservadores com a campanha publicitária.
Apesar da polêmica, o perfil da Havaianas no Instagram registrou crescimento expressivo de seguidores em curto espaço de tempo, mesmo após perdas iniciais durante o pico das críticas. Relatórios indicam a adesão de dezenas de milhares de novos seguidores em menos de 48 horas. O episódio ilustra como o engajamento impulsionado por críticas amplia o alcance do debate, concentrado na chamada “tribuna da internet”, onde as opiniões se distribuem entre avaliações positivas, negativas e neutras.
O comercial dominou a internet nos últimos dias, com enorme volume de menções e engajamento. A reação não foi unânime: houve debate polarizado, com críticas políticas e pedidos de boicote por parte de grupos conservadores, respostas irônicas da concorrência, e conversas mais amplas sobre linguagem e interpretação nas redes sociais. Ao mesmo tempo, a marca ampliou sua presença digital, registrando crescimento de seguidores mesmo em meio ao conflito.
Análise do case Havaianas
A análise feita por Gustavo Cruz, estrategista-chefe da RB Investimentos nos diz que esse fenômeno da Havaianas inflou, mas que logo será esquecido. A Havaianas já é uma marca consolidada, criada em 1962, e o efeito dessa polêmica tende a ser ainda mais limitado. A marca não enfrenta hoje um concorrente direto forte o suficiente para capturar uma eventual insatisfação pontual do consumidor. Além disso, o foco estratégico da empresa está muito mais voltado à expansão internacional. No mercado interno, a marca já alcançou um nível de penetração próximo da saturação, o que reduz o impacto de movimentos conjunturais como esse.
Assim como em outros episódios de cunho político, o impacto tende a se concentrar no curto prazo, no dia ou ao longo de algumas semanas, sem força suficiente para alterar a trajetória da marca. Essa leitura se apoia no histórico recente do mercado, especialmente em períodos eleitorais, quando executivos de grandes empresas se posicionaram publicamente e, no ciclo seguinte, esses movimentos não se traduziram em efeitos duradouros sobre os negócios.
Há exemplos claros disso. Edgar Corona, da Smart Fit, chegou a se manifestar politicamente em 2018, mas na eleição seguinte optou por não se posicionar, sem que isso tivesse provocado mudanças estruturais na percepção da marca ou na demanda. O mesmo vale para outros casos em que lideranças têm afinidades políticas conhecidas, como Luciano Hang, associado ao ex-presidente Jair Bolsonaro, ou Luiza Trajano, frequentemente ligada a posições mais próximas do presidente Lula. Esses alinhamentos individuais existem, mas não se mostram determinantes para o comportamento do consumidor no médio e longo prazo.
Situações desse tipo surgem de tempos em tempos, seja por declarações de CEOs, posicionamentos em campanhas publicitárias ou, em cenários mais graves, por problemas operacionais ou de governança. Esses últimos, sim, têm potencial de gerar impactos mais duradouros sobre as marcas, o que não parece ser o caso da Havaianas neste episódio.
Dalila da Silva
Jornalista graduada pela UFCA/CE, Produtora Audiovisual, Redatora e Revisora Textual.
